Aceitar,acolher, abraçar, agradecer: início da mudança

 

aceitação

Por que é tão difícil aceitar o outro como ele é? Fácil: porque insistimos em não nos aceitarmos como somos. Passamos uma vida buscando maneiras de nos encaixar em modelos, estereótipos, padrões, referências, paradigmas, exemplos, ideais… verdadeiras fôrmas de bolo de uma linha de produção. E em nome do quê? Pois é, justamente, de aceitação. Não uma aceitação qualquer, mas aquela que se traduza em um amor profundo e generoso, um amor que todos nós desejamos existencialmente oferecer a outros e receber deles mesmos.

Ao longo da vida iremos nos deparar com situações diversas, que transitam entre extremamente positivas a extremamente negativas do ponto de vista das emoções e dos sentidos. Mas, pela perspectiva do aprendizado, todas nos trazem ensinamentos, amadurecimento, conhecimento e riquezas vivenciais.

No entanto, muitas vezes, nossa reação inicial ao que chega é de declinar fortemente ao convite proposto. Recusamos de pronto o que não nos agrada à primeira vista.

As oportunidades que nos surgem precisam, inicialmente, ser acolhidas, ou seja, aceitas, abraçadas. E isso deve ocorrer não somente em relação àquilo que podemos mudar, mas muito mais ainda em face ao que não podemos mudar – e, tentar fazê-lo, representará sofrer mais que o necessário. Lutar contra uma situação intransponível, mesmo que momentaneamente, gera desgaste, prejuízos e traumas.

Apenas a partir daquilo que acolho/aceito, posso, então, seguir em frente, aguardando o momento, a possibilidade e uma nova oportunidade de transformação/mudança. Nada na vida é absolutamente estanque. Nem mesmo a morte física encerra a vida. Nada acaba ou finda, como bem constatou o químico francês, Antoine-Laurent de Lavoisier, “na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”.

Aceitar com humildade convida-nos a tolerar determinadas circunstâncias, entendendo que a vida não se traduz somente naquilo que consideramos como ‘bom, belo e agradável’. A vida não acontece em meio a um juízo de valor. Não há dicotomias e nem extremismos. Não somos apenas vítimas ou algozes. A vida naturalmente acontece e precisamos aceitar.

Ao mesmo tempo, somos instados a uma ação, que pode, em muitos casos, trazer um convívio respeitoso com aquela situação, sem que isso impacte em prejuízos físicos e emocionais intoleráveis. Mesmo vivendo em circunstâncias difíceis, que seja possível seguir com energia, interesse e foco em outras áreas e oportunidades, na esperança de que novas portas se abram.

Aceitar é reconhecer a nossa impotência diante de algo. E o que não tem solução, resolvido está, mesmo que momentaneamente. Assim, o melhor é continuar caminhando, pois é caminhando que construímos o caminho.

Colocando em pensamentos, seria algo como: “Diante desta situação, neste momento, não há nada a fazer. Porém, sigo minha vida, aguardando oportunidades para que uma transposição disso seja possível”.

Já a resignação traz mais sofrimento, uma vez que nos colocamos em posição de espera. À espera de que tudo mude magicamente. Não abraçamos o sofrimento que veio para nos ensinar. Em vez disso, ligamos o modo ‘sobrevivência’, imaginando que tudo sumirá quase que por um milagre.

Assumimos o peso de uma âncora, presos à situação, compadecendo-nos e nos sentindo vítimas dela. Como ‘âncora’, ela passa a amarrar iniciativas, bloquear movimentos, escravizando-nos com a crença de uma imutabilidade. Deixo então de buscar outros e novos caminhos. RESIGNO-ME.

É perceptível a diferença de atitude. Quando ACEITAMOS, acolhemos, abraçamos a realidade que chega como mais uma oportunidade de vida e de viver. Continuamos a nossa jornada, e isso nos permite manter um nível de felicidades e de gratidão por novas possibilidades que vão surgindo, sem que, necessariamente, a dificuldade precise ser resolvida antes de aproveitar cada segundo de nossa existência.

Não me bloqueio por isso, não penso que será sempre assim por isso, mas aprendo com essa experiência e continuo o meu caminho. A aceitação é não ir contra a corrente, mas aproveitar as situações para aprender com a vida. Sempre existe a possibilidade de corrigir o nosso rumo.

A aceitação visceral também passa pelo respeito e humildade ao, verdadeiramente, acolher as pessoas como elas são. Desaparece o desejo de mudá-las. Observo até onde posso ir nessa relação e se isso me convém ou não, se estou sendo respeitada

Quanto ao falecimento de uma pessoa amada, aceitar significa superar o luto, sem sentir revolta, dando um rumo à vida e abrindo as portas para o novo, depois de superadas as etapas próprias e naturais de um processo de perda.

A resignação impede a superação natural do luto. Muitos ficam revoltados, não admitem a mudança que esta perda traz e isso faz parte do processo de superação. Porém, esse sentimento se converte em um estado permanente para quem não consegue abraçar a sua própria dor e nem para de buscar culpados.

Do mesmo modo, quando passamos por um grave trauma – independentemente de quem tenha sido responsável, ‘culpado’, por ele -, a aceitação do ocorrido e o entendimento de que cada um responde por seu passivo vivencial nos liberta para que possamos seguir em frente. O filósofo e escritor francês Jean-Paul Sartre bem resume essa postura frente à vida: “Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim.”

A aceitação é, sobretudo, uma postura de fé na misericórdia divina. Não faltam frases de sábios que resumem essa escolha. O psiquiatra e psicoterapeuta Carl Gustav Jung também defendia essa ideia: “O que negas te subordina. O que aceitas te transforma”.

A resignação é a submissão à vontade de alguém ou ao destino, quando então o resignado sofre, queixa-se e se lamenta o tempo todo frente à realidade que se apresenta, com o pensamento fixado naquilo que gostaria que fosse. Isso o mantém paralisado, passivo, escravo de um intenso sofrimento cuja chave está nas suas próprias mãos.

Aceitar é indício de lucidez. É a compreensão de que naquele momento, nada mais resta da não ser acolher o que se apresenta, e, a partir desta ação, colocar-se em prontidão para olhar atentamente mais uma vez a situação, agora sem a carga emocional da rejeição. Assim, pode-se ver a realidade de novos ângulos e sob novas perspectivas, abrindo espaço para o surgimento de possíveis soluções. Tudo no universo é puro movimento. Nada é permanente ou imutável.

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